Antiga, Mui Nobre e Orgulhosamente Só
A presidência de Rui Moreira na Câmara Municipal do Porto (CMP) acumulou, ao longo dos vários mandatos, escândalos, surpresas e momentos de completa imbecilidade, que lhe custaram, por exemplo, a maioria absoluta nas últimas eleições. Passando pelo caso Selminho, que quase fez cair por terra a sua recandidatura, à sua inclusão nas listas de Pinto da Costa para a estrutura do Futebol Clube do Porto (que evidencia uma ligação perigosa, abjecta e surreal entre política e futebol), chegamos a um novo caso que é, provavelmente, a cereja no topo deste bolo autárquico – a saída da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP).
Rui Moreira, insatisfeito com a nova presidência da ANMP, entregue a Luísa Salgueiro, presidente da Câmara Municipal de Matosinhos (PS), decidiu, com o aval de partidos como a IL e o PSD, abandonar aquela que é a associação agregadora dos municípios portugueses. Com uma justificação infantil – afirmar que a actual presidente é próxima do governo – bateu a porta à associação que, entre muitas funções, possui o chamado soft power junto do poder central (importa relembrar que a presidente da ANMP é do mesmo partido que o governo, ridículo seria se não fosse próxima do mesmo). Magistratura de influência, rede de contactos, participação informal em diversos eventos perto do poder de decisão, elemento agregador das vontades locais são características desta associação que negoceia, directamente com o governo, as diversas necessidades dos autarcas. Havendo falta de estruturas regionais que sejam um meio termo entre o poder local e o poder central, a ANMP é, quiçá, o maior elo de ligação entre os dois poderes. E, claro, um município sozinho, por muito grande que seja, nunca terá o poder negocial que 308 municípios em conjunto têm – isto é lógica elementar.
Rui Moreira, qual criança que abandona o jogo quando a sua equipa não ganha, deixou que a ANMP perdesse a principal voz do norte litoral, que é também a segunda mais importante câmara do país. Contudo, quem perde mais com esta decisão são os habitantes do Porto, por muito que Rui Moreira tente pintar o contrário. O Porto deixou de ter representação junto do poder central, não há volta a dar a esta questão. Como é claro, o governo não vai negociar isoladamente nem com Rui Moreira nem com qualquer outro presidente de câmara. O governo continuará a negociar com a ANMP, que representa os restantes 307 municípios e o Porto deixará de ter uma voz tão significativa. Acho inimaginável que o presidente do Porto tenha uma atitude digna de um aluno da escola secundária. Rui Moreira gere a segunda câmara mais importante do país e a câmara mais relevante da segunda maior área metropolitana do país. Uma atitude imatura como esta não devia ter lugar nos patamares cimeiros da nossa sociedade.
Como disse anteriormente, a saída da CMP da ANMP prejudica imensamente mais os habitantes do Porto (e de toda a área metropolitana) do que os restantes municípios, pois estes continuam a ter quem os represente – a câmara do Porto possui agora apenas um presidente que se crê maior do que o concelho que comanda. Rui Moreira está a fazer exactamente o contrário do que se esperava do presidente da câmara do Porto: ser um líder da região, capaz de agregar vontades, marcar posição dentro do jogo negocial, construir um futuro digno para o concelho e para o país.

Rui Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto
Mas o desplante de Rui Moreira vai ainda mais além. Para além de ter batido o pé à ANMP, foi semear na comunicação social a sua vontade de reunir e negociar directamente com o governo. Desdisse-se uma semana depois. Foi também a Belém pedir ao Presidente da República que este não promulgasse o Orçamento do Estado (OE) para o presente ano. Estando este já 6 meses atrasado, com todas as ineficiências e limitações que a gestão por duodécimos tem, e que Rui Moreira, como brilhante gestor, conhece, protelar ainda mais o OE seria uma completa parvoíce, ainda para mais num clima económico instável. Não bastava a sua falta de cultura democrática, ao ter saído da ANMP por esta estrutura ser presidida por alguém do PS (como haveria de ser, visto ser o partido com a maioria das câmaras), ainda tentou minar as instituições democráticas e subvertê-las à sua vontade. Tal atitude não é condigna de alguém que comanda a CMP.
Rui Moreira esteve durante todos os seus mandatos constantemente a puxar a corda ao poder central e aumentar o clima de tribalismo entre o “Norte” e “Lisboa”. Nunca deixou o seu ego e vaidade esmorecer, marcando constantemente posição na comunicação social, numa tentativa egomaníaca de se pintar como o defensor último da região norte – o novo vice-rei do Norte. É mais que notória a sua vontade de ir para outros palcos, como a presidência do Futebol Clube do Porto. É vergonhoso o uso da política para chegar longe no futebol (e vice-versa) e esta deveria ser uma ligação com muitas restrições. Porque não, por exemplo, proibir a pertença a qualquer organização, ainda que de forma informal, que tenha negócios com a Câmara Municipal que se gere e incluir, também, um período de nojo no fim do mandato?
Com tiques autocráticos, iliberais, regionalismo bacoco, desfaçatez e um ego maior que a área que comanda, Rui Moreira está a cavar a sepultura de um concelho que quer ser um dos principais pontos da Península Ibérica. Com Rui Moreira ao leme, não haverá barco que chegue a bom Porto.
O autor não segue o novo acordo ortográfico