Regionalização, de novo!


No sábado passado a regionalização foi tema de destaque no jornal Público, com nada menos que dois artigos de opinião contra a mesma: um do sociólogo António Barreto e outro do advogado Francisco Mendes da Silva. Se este último levanta várias questões e impedimentos ao processo de discussão da regionalização, o primeiro é claramente contra o avanço deste modelo no nosso país.

Outrora escrevi neste mesmo blogue um artigo a defender a regionalização, onde afirmei que 2024 era uma data extremamente conservadora para iniciar o seu processo de discussão. António Costa deve ter lido o artigo supracitado pois já admitiu um referendo para a regionalização em 2024, com a concordância de Rui Rio e Marcelo Rebelo de Sousa. Prevê-se, portanto, que a discussão possa iniciar-se ainda este ano ou no início do próximo.

Voltando aos artigos presentes no jornal Público, António Barreto afirma que os defensores da regionalização ignoram o facto de grandes avanços civilizacionais no nosso país serem de carácter nacional, como o SNS, o acesso a universidades ou à segurança social. António Barreto, no entanto, esqueceu-se de referir que os opositores da regionalização ignoram as assimetrias do nosso país, seja no acesso aos serviços acima referidos, seja na quantidade e qualidade das oportunidades profissionais e pessoais. Se não as ignoram, não apresentam planos para as resolver.

Volto a partilhar abaixo a imagem que publiquei no meu último artigo sobre regionalização. Portugal é um dos países menos regionalizados da OCDE e figura vários valores abaixo da média. Atrás de Portugal praticamente só figuram países com uma dimensão e população bastante inferior à nossa e que, portanto, não sentem tanto essa necessidade por não existirem assimetrias tão vincadas.

Dupond e Dupont

Índex de Autoridade regional em Portugal e noutros países da OCDE - O índex de autoridade regional (Regional Authority Index - RAI) é uma medida da autoridade dos governos e instituições regionais. Compreende várias dimensões como autonomia fiscal, representatividade, controlo executivo e fiscal, entre outros. Fonte: OCDE library

Francisco Mendes da Silva, não sendo tão veemente contra a regionalização como António Barreto, confunde a necessidade da regionalização com uma alegada questão de “auto-suficiência” ou com uma suposta diferença da identidade cultural das regiões. Segundo Francisco Mendes da Silva estas razões não são válidas para iniciar o processo de regionalização pois nada disto existe no nosso país. Estamos de acordo nesse ponto. Ainda assim, estas questões pouco ou nada acrescentam ao debate. Creio que Francisco Mendes da Silva não entendeu o objectivo da regionalização. Esta faz-se para potenciar todas as regiões do nosso país e não só as duas grandes áreas metropolitanas. Faz-se, não por existir uma diferença cultural vincada mas para criar uma menor desigualdade de oportunidades. Faz-se, não por uma necessidade de “auto-suficiência” mas antes para tirar partido das particularidades de cada região.

Já António Barreto afirma que a regionalização nada pode fazer pelo combate à desigualdade e à pobreza, nomeadamente infantil. Pelo contrário, a regionalização pode fazer e muito! Ao constituirem uma figura intermédia entre o poder local e o poder central, as regiões podem desenhar projectos específicos que respondam às necessidades da sua população. Podem também canalizar fundos para um maior e melhor desenvolvimento da sua região, potenciando o crescimento económico e, por conseguinte, reduzir significativamente a desigualdade e a pobreza.

António Barreto também afirma que a regionalização nada pode fazer pela formação secundária técnica, profissional e superior. Pelo contrário, a regionalização pode fazer e muito! Conhecendo a realidade do meio que regem, as regiões administrativas podem fomentar a parceria entre empresas e instituições de ensino (secundário e superior), para que estas possam oferecer formação especializada com empregabilidade nos sectores empresariais em redor. Uma parceria mais vincada entre a investigação e as empresas potenciará o crescimento, que se irá traduzir em benefício para toda a região e, no limite, para todo o país.

Por fim, António Barreto também afirma que a regionalização nada pode fazer pela política demográfica. Pelo contrário, a regionalização pode fazer e muito! A regionalização, ao responder às necessidades prementes da população local potenciará emprego, saúde, educação e cultura, permitindo uma maior fixação de população jovem. Evitará um êxodo cada vez maior para os centros urbanos, oferecendo um estilo de vida digno. Esta fixação com uma qualidade de vida superior, aliada a apoios específicos e locais como creches ou isenções fiscais para o interior, podem aumentar a taxa de natalidade. Além disso, as novas formas de trabalho, nomeadamente o remoto, podem ajudar neste processo. O maior encontro geracional entre jovens e idosos também irá resultar em benefícios para ambos, aumentando a solidariedade intergeracional.

António Barreto termina o seu artigo com “(...) As regiões do interior e do resto do país não têm força própria, nem recursos para assumir um papel relevante de desenvolvimento”. Concordo em absoluto com esta frase e apresento uma forma de resolver esse problema: regionalização.

O autor não segue o novo acordo ortográfico


Gostou deste artigo? Partilhe nas redes sociais!